Pablo Larraín encerra sua trilogia com louvor, nos mostrando a humanidade de uma das mulheres mais icônicas do século XX.
Pablo Larraín deixou sua marca ao consolidar-se como um audacioso diretor ao transformar o que seriam biografias tradicionais em grandes experiências cinematográficas. Com “Jackie” (2016), “Spencer” (2021) e agora “Maria Callas” (2024), ele criou uma trilogia não oficial, unificada por temas que examinam a vida de mulheres icônicas em momentos cruciais de crise, humanidade e reinvenção.
Em “Maria Callas“, o diretor traz um retrato impressionista e visceral de uma das figuras mais emblemáticas da ópera. Assim como nas suas duas biografias anteriores, Larraín aplica aqui sua sensibilidade estética para desvendar a complexidade emocional de Callas. O resultado é um filme que explora não apenas a história da diva, mas sim sua personalidade e humanidade por trás da fama. Suas crises, problemas e até mesmo sua insegurança com a própria voz, que foi um símbolo icônico e possívelmente o mais famoso soprano do século passado.

Conduzindo a narrativa sob um olhar melancólico, visivelmente reforçado pela direção de fotografia elegante, que utiliza de luzes e sombras para expressar os momentos de dor da soprano, Pablo nos entrega uma obra extremamente introspectiva e poética.
Angelina Jolie é um dos maiores pontos positivos do filme. Sua atuação transparece a dualidade entre a força feminina presente nos palcos e a fragilidade da personagem quando entra em conflito com suas batalhas internas. Sua performance captura consideravelmente o quanto o peso do perfeccionismo e da solidão afetou a vida dessa mulher extremamente forte e marcante.
Vale ressaltar que Angelina foi a primeira e única escolha de Pablo para o papel. Se ela não tivesse aceitado, ele se recusaria a dirigir o filme. Ela, então, recusando-se a ser dublada e desejando cantar por conta própria, teve 7 meses de aulas de ópera para se preparar para seu papel. Mesmo assim, para as cenas ambientadas durante o apogeu de Callas, cerca de 90 a 95 por cento das gravações originais de Callas foram usadas, com Jolie dublando essas músicas.

A escolha de planos fechados, às vezes até desconfortáveis, aproximam o espectador da mente da protagonista. Essa abordagem é reforçada pelos lindos cantos performados durante o filme, que se tornam expressões diretas da complexidade emocional da personagem. O tempo inteiro, essa escolha ressalta o impacto que o meio artístico tem sobre a personagem principal.
“Jackie”, “Spencer” e “Maria Callas” formam um estudo cinematográfico fascinante sobre mulheres icônicas que foram destruídas pelo peso da fama e da expectativa social. Esses três filmes entregam retratos íntimos, belos e dolorozos que humanizam essas figuras anteriormente vistas como indestrutíveis aos olhos dos espectadores. Ao fim, nos deixa uma reflexão sobre os custos do poder e da arte. Com seu roteiro contemplativo, Steven Knight prioriza momentos de silêncio e introspecção ao invés de encher a obra com diálogos expositivos. A junção do roteiro de Knight com a direção de Larraín traz uma excelente captura da essência da personagem em momentos importantes da sua vida.

“Maria Callas” é um filme profundamente sensorial e emocional, que, assim como seus dois antecessores, honram a figura feminina protagonista sem ignorar suas vulnerabilidades. Não só celebrando o legado de Callas, o diretor explora os sacrifícios que à levaram a perfeição, com uma experiência cinematográfica que ficará na memória e que, mais uma vez, demonstra a tremenda capacidade de Pablo em construir cinebiografias únicas, intimistas e autênticas.
Crítica por Pedro Gomes.
Assistido na 48ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.

Maria | Maria Callas
Alemanha/Itália/Estados Unidos, 2024, 123 min.
Direção: Pablo Larraín
Roteiro: Steven Knight
Elenco: Angelina Jolie, Pierfrancesco Favino, Alba Rohrwacher
Produção: Juan de Dios Larraín, Lorenzo Mieli, Jonas Dornbach
Direção de Fotografia: Edward Lachman
Classificação: 14 anos
Distribuição: Diamond Films










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