Paul Thomas Anderson expõe as contradições da supremacia branca em uma guerra que nunca termina.
No novo filme de Paul Thomas Anderson, acompanhamos um grupo de antigos revolucionários que entra em ação após anos fora de atividade para resgatar a filha de um deles das garras de um inimigo antigo e perigoso. O diretor utiliza aqui sua habilidade de criar um épico intimista que transforma uma história de perseguição política em uma crítica afiada sobre autoritarismo e preconceito, sendo este seu melhor filme após “There Will Be Blood“, de 2007.
O antagonista Coronel Lockjaw é interpretado por Sean Penn (para o qual apostamos fortemente em uma indicação ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante). Lockjaw simboliza com maestria a arrogância de uma ideologia supremacista: militarizado, autoritário e crente em sua superioridade. Ele pode ser visto como o retrato de um Estado que abusa de seu poder para eliminar qualquer voz com o mínimo traço de oposição ou rebeldia.

Anderson constrói de forma admirável a figura de um autoritarismo que, no fundo, revela exatamente o que é: uma ideologia frágil, sustentada por racismo, elitismo e pelo controle da narrativa. O poder absoluto, na verdade, é extremamente frágil, inflado em um discurso mentiroso que engana até os próprios discursantes. O antagonista se vê como um todo-poderoso invencível, mas na verdade é corroído pelas suas próprias obsessões, o que o reduz a uma impotência amarga que expõe a farsa da supremacia branca.
O poder opressor carrega em si uma contradição inevitável: ele se sustenta em discursos de moralidade e ordem, mas pratica justamente aquilo que condena. Essa hipocrisia é parte do seu mecanismo de controle: impor regras rígidas aos outros enquanto se coloca acima delas. Essa duplicidade não é exceção, é a regra: quanto mais alguém insiste em propagar uma moral absoluta, mais provável é que esteja tentando mascarar suas próprias fragilidades e contradições. O personagem de Sean Penn é o maior exemplo disso e Paul Thomas Anderson desenvolve esse antagonista de forma inigualável com base nessa duplicidade. No fundo, todo poder autoritário é hipócrita porque exige dos outros aquilo que não é capaz de cumprir. E é justamente essa fragilidade que o torna irônico, ridículo e, muitas vezes, trágico.

Leonardo DiCaprio entrega aqui uma das atuações mais intensas da sua carreira. Seu personagem é um ex-revolucionário marcado pelo trauma e pela culpa, traumatizado por batalhas não vencidas e ideais desacreditados. É através da relação dele com a filha que o filme traça seu arco de maior emoção. A jovem não é apenas alguém a ser salva: ela representa o futuro, a possibilidade de romper o ciclo de violência e, ao mesmo tempo, o peso das histórias que se tentam apagar. A humanidade dessa relação torna o confronto político ainda mais doloroso.
Apesar de todos os personagens serem construídos de maneira exemplar, Anderson sabe que não é só de um bom roteiro que um filme precisa, e é na mise-en-scène que o longa atinge sua plenitude. Cada enquadramento é calculado para amplificar a tensão entre memória e presente: ambientes opressivos, sombras que engolem personagens, espaços abertos que paradoxalmente aprisionam. Um exemplo disso é uma certa perseguição, que remete ao clássico “Duel” de Steven Spielberg.
A trilha sonora oscila entre notas melancólicas e explosões caóticas, conduzindo o espectador pelo estado emocional dos personagens, intensificada ainda mais pelo poder do som em IMAX.

One Battle After Another é mais do que um thriller ou filme de ação com grande orçamento. Ele acerta quando consegue equilibrar ação com crítica, sem cair em simplismos, construindo uma imersão extraordinária. Sem sombra de dúvidas, a nova obra de PTA é o melhor filme de 2025 até o momento. O espectador é impossibilitado de piscar ou sequer se distrair por um instante A tensão que permeia o filme é simplesmente avassaladora e indescritível.
Crítica por Pedro Gomes.
Uma Batalha Após a Outra | One Battle After Another
Estados Unidos, 2025, 162min.
Direção: Paul Thomas Anderson
Roteiro: Paul Thomas Anderson
Elenco: Leonardo DiCaprio, Sean Penn, Chase Infiniti
Produção: Paul Thomas Anderson, Sara Murphy, Adam Somner
Direção de Fotografia: Michael Bauman, Paul Thomas Anderson
Música: Jonny Greenwood
Classificação: 16 anos
Distribuição: Warner Bros. Pictures
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