Uma fábula que reflete sobre o valor das memórias e a urgência de vivê-las.
The Girl Who Stole Time segue a história de Qian Xiao, uma aldeã de uma vila de pescadores que, após um naufrágio, adquire a posse de um amuleto chamado “Time Dial”. Este misterioso dispositivo lhe concede a capacidade de controlar o tempo, mas também atrai a atenção de uma poderosa organização determinada a caçá-la. Em sua jornada, ela encontra Seventeen, um membro da organização, e o confronto inicial de ambos se transforma em uma poderosa e inesperada amizade à medida que embarcam em aventuras fantásticas pela movimentada cidade inspirada na Xangai de 1930.
Desde os primeiros minutos, a beleza visual da animação 3D é encantadora. A imersão nesse universo mágico é quase instantânea, e o prólogo, que mostra como o artefato foi parar no fundo do mar, é uma introdução extremamente funcional, com um misto de ação e aventura que envolve o espectador mesmo antes da aparição do título.

A estética remete a seriados e filmes antigos de aventura, e seduz o espectador quase que de imediato com uma forte carga de nostalgia. O ritmo é bastante fluido e capaz de entreter crianças e adultos. Nossa protagonista, extremamente carismática, faz de The Girl Who Stole Time uma viagem empolgante e efervescente, enquanto o personagem Seventeen, inicialmente apresentado como antagonista, ganha camadas conforme o filme avança. Quando ele decide se aproximar de Qian, seu conflito interno entre dever e sentimento torna-se um dos aspectos mais ricos do roteiro.
O relacionamento entre Qian e Seventeen é o fio condutor emocional da trama. O filme evita cair em fórmulas românticas fáceis e desenvolve entre os dois uma conexão baseada em confiança, escolhas e sacrifícios. Conforme o tempo escapa de suas mãos, o laço entre eles se torna ainda mais precioso, e é através dessa relação que o filme nos convida a refletir sobre a efemeridade dos encontros humanos e o quanto o amor, por mais breve que seja, pode marcar para sempre uma vida. Não se trata de uma história sobre “felizes para sempre”, mas sobre o valor de cada instante partilhado.

A capacidade de parar o tempo é um sonho adorado e desejado por todos, mas como o filme nos mostra, essa dádiva tem um preço. O terceiro ato do filme dialoga filosoficamente com o existencialismo. A aventura se torna drama, e somos surpreendidos por uma mensagem de aceitação de nossas limitações. Apesar de desejarmos controlar o tempo, o destino e a memória, não temos essa capacidade. A narrativa ganha densidade emocional ao apresentar escolhas difíceis e perdas inevitáveis. Como o próprio filme diz: o tempo destrói tudo.
A trilha sonora acompanha esse universo com sutileza. Em momentos de ação, os arranjos aceleram o ritmo da narrativa, enquanto nas cenas de maior contemplação, prevalecem silêncios e melodias suaves, que reforçam a carga emocional das imagens. Esse estilo de trilha contribui para uma atmosfera envolvente, onde até o fantástico parece possível.

The Girl Who Stole Time é uma aventura épica e nostálgica sobre a relação entre amor e tempo. Divertida, intrigante e visualmente encantadora, a obra mergulha em temas universais com uma sensibilidade rara. Seu final melancólico, mas profundamente humano, ressoa como uma carta de amor ao cinema, à juventude e às escolhas que moldam quem somos. O filme encontra seu brilho na honestidade com que abraça a fantasia para falar do real.
Crítica por Pedro Gomes.
Filme assistido no Annecy International Animation Film Festival (2025)
Annecy Presents

The Girl Who Stole Time | 时间之子
China, 2025, 107min.
Direção: Yu Ao, Zhou Tienan
Roteiro: Yu Ao, Yicheng Shu, Zhou Tienan
Elenco: Karry Wang, Liu Xiaoyu, Zhou Shen
Produção: Sun Lingyu
Música: Luan Hui









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