Crítica – Tales From the Magic Garden (Pohádky po babičce)

Tales From the Magic Garden celebra o poder da imaginação infantil como instrumento de cura em uma fábula nostálgica e emocionante.

Tales from the Magic Garden, animação em stop-motion exibida no Festival de Annecy 2025, segue uma avó contadora de histórias que cria mundos e personagens imaginários para seus três netos. Com apenas um chapéu, ela pede que cada neto escolha um elemento para fazer parte da história, e dá vida a universos deslumbrantes e graciosos. Após o falecimento da avó, os netos visitam o avô em sua casa e preenchem o vazio do luto com o nostálgico chapéu, no qual agora eles mesmos têm a possibilidade de criar e inventar contos por meio da imaginação. Assim, surge um mosaico de três histórias: três segmentos que exploram temáticas de perda, medo e reencontro, com bastante ternura e delicadeza.

Muitos filmes falam com nosso coração, mas esta obra, além disso, evoca uma nostalgia da casa de nossos avós que é quase indescritível. É um filme sobre a saudade da presença e do tempo em que tudo era mágico, pois não percebíamos a efemeridade da vida: a infância. Uma das maiores belezas da infância, além da inocência, é a capacidade de interpretar o mundo através da fantasia e da imaginação. Antes de aprender a ler ou escrever, a criança desenha. Desde os primórdios da humanidade, a comunicação sempre se iniciou com desenhos. Para uma criança, um pedaço de papel, um chapéu antigo ou uma caixa de sapatos é suficiente para que ela crie universos onde pode se entender, se proteger e, principalmente, sentir.

Annecy International Animation Film Festival (2025)

Feita em stop-motion, a direção de arte chama a atenção por construir um ambiente rico em detalhes e texturas, com uma paleta de cores quente e vibrante, que remete a um caloroso e afetuoso outono. Os momentos mais melancólicos das histórias narradas pelas crianças são preenchidos por tons frios que, em contraste com as cores fortes da realidade, demonstram a versatilidade da imaginação infantil. O movimento imperfeito dos bonecos e a textura palpável dos cenários criam uma sensação de proximidade.

Cada fábula, apesar de lidar com temas como perda, medo e transformações, é narrada com leveza, fazendo com que os assuntos abordados sejam acessíveis às crianças, trazendo uma espécie de conforto e abraçando também os espectadores mais velhos, nos fazendo querer retornar ao quintal da avó uma última vez. A abordagem utilizada é suave e tocante, revelando o cuidado em tratar temas complexos dentro de uma atmosfera acolhedora, de forma que se direcione ao público infantil sem lhe retirar a inocência.

Tales From the Magic Garden – Annecy International Animation Film Festival (2025)

Os diretores comentaram sobre como foi difícil equilibrar tristeza e leveza para que o filme fosse acessível a crianças de 6 a 10 anos. É fascinante como a transição entre realidade e fantasia nunca é explícita. O espectador não vê o momento exato em que a história vira imaginação, mas sente que está dentro de algo mágico. Quando o luto chega cedo demais na vida das pessoas, a imaginação não é uma negação da morte, mas uma forma poética de aceitá-la. Ao reinventarem as histórias contadas pela avó falecida, as crianças do filme mantêm viva não apenas a memória, mas o vínculo afetivo. As histórias não são uma fuga da realidade, mas sim uma ferramenta que ajuda a entender a morte e seguir em frente, mantendo viva a presença de quem se foi.

Para mim, como alguém que cresceu brincando num quintal que hoje parece pequeno demais diante das lembranças, este filme me pegou pela mão e me levou de volta até lá. Fez-me lembrar da minha avó, das tardes com meus primos que não tinham fim. Talvez crescer seja aprender a ser o contador das histórias que um dia ouvimos. E passá-las adiante, do nosso jeito, com nossos próprios erros, mas com a mesma magia.

Tales From the Magic Garden – Annecy International Animation Film Festival (2025)

Mais do que nostalgia, Tales from the Magic Garden é sobre o poder de contar histórias. E de recontá-las, mesmo quando quem as narrava já não está mais aqui. É, antes de tudo, uma ode à infância, celebrando o ato de brincar, a criatividade e a imaginação.

 

Crítica por Pedro Gomes.

Filme assistido no Annecy International Animation Film Festival (2025)

Feature Films Contrechamp

 

Tales From the Magic Garden
Tchéquia/Eslováquia/Eslovénia/França, 2025, 70min.
Direção: Jean-Claude Rozec, Patrik Pašš, Leon Vidmar, David Súkup
Roteiro: Blandine Jet, Jerneja Kaja Balog, Maja Križnik
Elenco: Zuzana Kronerová, Arnošt Goldflam, Mikuláš Čížek
Produção: Martin Vandas, Juraj Krasnohorský, Kolja Saksida
Direção de Arte: Patricia Ortiz Martinez, Jean-Claude Rozec
Música: Lucia Chuťková

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