Um retrato glorioso da luta pela sobrevivência em meio à opressão.
Kleber Mendonça Filho após o sucesso do documentário Retratos Fantasmas, embarca em um thriller político ambientado na década de 70, em meio à ditadura militar. Não só revisitando o passado, Kleber arquiteta sua narrativa confrontando o modo como a memória foi manipulada, silenciada ou apagada, e como essa tentativa de esquecimento continua a reverberar no presente.
A obra acompanha Marcelo, um técnico exilado que retorna ao Recife para reencontrar o filho, mas que rapidamente percebe que seu retorno é atravessado por vigilância, ameaças veladas, suspeitas e fantasmas pessoais. O diretor constrói um suspense político em que a atmosfera de medo é tão relevante quanto as ações dos personagens. O cotidiano deles é constantemente tensionado pela repressão, como se a ditadura fosse uma presença invisível que infiltra-se em tudo. O espectador sente-se perseguido, assim como o personagem principal.

Wagner Moura está na performance mais emblemática e memorável de sua carreira desde o aclamado Tropa de Elite, de José Padilha. No filme de Padilha, a performance de Moura é marcada pela agressividade, brutalidade e pelo magnetismo de um personagem que transborda violência. Em O Agente Secreto, o personagem de Wagner trilha o caminho oposto. Marcelo não é um homem que impõe respeito pelo grito ou pela arma em punho, mas sim alguém que carrega o peso da opressão em gestos contidos. Moura constrói a interpretação a partir da consciência de que cada passo pode ser fatal. Essa sutileza transforma o personagem em um reflexo direto da sobrevivência em tempos de ditadura. O contraste entre os dois personagens é fundamental para compreendermos a força dessa atuação.
Ao escolher misturar o suspense de investigação com a crítica política, o diretor foge das simplificações fáceis. O protagonista não é explicado por completo, e isso reforça o clima de mistério: não sabemos tudo sobre ele, assim como também não há heróis ou vilões claros na trama. O que vemos é um Brasil marcado por medos e traumas, em que sobreviver significa insistir em gestos pequenos, mas fundamentais, como seguir em frente, guardar a memória e não desistir de existir.

A fotografia de Evgenia Alexandrova mergulha o espectador em um Recife dos Anos 70 em uma das melhores ambientações da década. De forma grandiosa, as texturas granuladas e cores quentes auxiliam na imersão do espectador nessa trama repleta de segredos.
Com 158 minutos de duração, o filme mais longo da carreira de Kleber Mendonça Filho, o filme aposta em um ritmo que dá espaço para silêncios, olhares e tensões acumuladas. A trilha sonora acompanha o longa, intensificando todos os seus momentos de tensão e criando um ambiente onde a opressão política e a resistência cultural coexistem.

Em suma, O Agente Secreto é uma obra que utiliza a linguagem audiovisual para fazer o público sentir o peso da história e da sobrevivência em meio à repressão.
Crítica por Pedro Gomes.
Filme assistido no CineBH International Film Festival (2025)
O Agente Secreto
Brasil/França/Alemanha/Países Baixos, 2025, 158min.
Direção: Kleber Mendonça Filho
Roteiro: Kleber Mendonça Filho
Elenco: Wagner Moura, Carlos Francisco, Tânia Maria
Produção: Kleber Mendonça Filho, Wagner Moura, Brent Travers
Direção de Fotografia: Evgenia Alexandrova
Classificação: 16 Anos
Distribuição: Vitrine Filmes
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