O Épico retorno ao cinema histórico do espetáculo.
Decidir por se fazer uma sequência de um filme muito consagrado, passados anos de seu lançamento, não é uma tarefa fácil. Seja porque já existe todo um imaginário popular criado em cima da obra original, seja porque a chance de se criar uma história que seja comparativamente inferior é grande. Conseguir suprir as expectativas, ou ao menos não diminuí-las, deve ser uma preocupação nas mentes responsáveis pela decisão de se estender o universo em questão. Para Ridley Scott e seu Gladiador II, fica nítido o sucesso neste quesito.
Retornar às antigas ruas de Roma e aos corredores macabros do Coliseu, às cidades e vilarejos próximos a Roma, tão distintos de sua grandeza, trazem ao espectador uma nostalgia imediata. A preocupação artística do filme em se manter fiel ao cenário retratado do primeiro filme, mesmos tons e atmosfera já nos insere de forma profunda no que se está a ver. E desde os primeiros minutos, fica bastante claro: estamos vendo uma continuação, que ao mesmo tempo se coloca como diferente, mas de certa forma bem semelhante.

A diferença de tempo diegético (o tempo narrativo) entre os filmes é de algumas décadas. Tempo suficiente para percebermos mudanças em um império e suas políticas, mas tempo pouco para que as mudanças sejam avassaladoras em uma sociedade acostumada a séculos de dominação romana. E essa dicotomia é mostrada de forma bem articulada no filme. Propositalmente, vemos situações semelhantes ao primeiro filme, tanto em contextos e personagens, quanto em escolhas cinematográficas, nos mostrando que o que vemos é algo novo, mas com todo vínculo ao passado. Scott consegue trazer um novo dilema, atrelando-o ao filme original, sem que seja, contudo, um arrasto do primeiro.
A quem busca um entretenimento de qualidade, um filme épico, com batalhas e conflitos grandiosos e efeitos visuais e especiais dignos de tirar o fôlego, tem-se um prato cheio. Aos curiosos sobre os acertos e erros históricos, também vale a pena. O modo como os fatos históricos se colocam à disposição do filme em nada depõem contra a sua narrativa. Ao contrário, são usados de maneira inteligente. No quesito roteirização, há que se dizer que Gladiador vence em relação à sua sequência, por conseguir ser, ao mesmo tempo, um filme de espetáculo e também um drama muito bem articulado. No caso de Gladiador II, temos muito mais um filme focado em sua essência espetacular, o que não significa um demérito, apenas uma conclusão inevitável a favor do primeiro.

Os grandes destaques desse novo filme ficam, sem dúvidas, a cargo do design de som e das atuações de Denzel Washington, Joseph Quinn e Fred Hechinger. Nada mais recompensador do que um filme que traz imersão ao espectador a partir do trabalho cuidadoso em sua parte de áudio. Com uma trilha bem encaixada, captação de som muito bem feita, foleys criados de maneira extremamente adequada e uma trilha sonora escolhida a dedo, o filme se torna um deleite aos ouvidos atentos. Quanto às atuações, é preciso dar menção especial ao trabalho realizado pelos três atores anteriormente citados. Denzel Washington rouba a cena interpretado Macrinus, não apenas por conta da viceralidade que coloca em suas palavras, mas pela capacidade de nos colocar frente a um personagem dúbio e que reflete perfeitamente as incongruências humanas e necessidades políticas. Já Joseph Quinn e Fred Hechinger se destacam ao nos colocar frente, respectivamente, à loucura de Geta e Caracalla, os Imperadores irmãos. A ausência da realidade e a completa falta de noção cívica e política de ambos salta em meio a todo o resto. São alívios cômicos que, no fundo, revelam a podridão da governança.

“Gladiador II” pode ser considerado um filme-homenagem. Também pode ser visto como uma continuação comum. Seja como for, o esforço colocado em sua realização se mostra positivo, e temos um belo exemplo de como um filme de entretenimento pode, sem nenhuma dúvida, ser exemplo da grandiosidade do cinema.
Obs adicional: A quem pode, vale a pena ser visto em IMAX.
Crítica por Bianca Rolff.

Gladiador II | Gladiator II
Estados Unidos, 2024, 148 min.
Direção: Ridley Scott
Roteiro: David Scarpa
Elenco: Paul Mescal, Denzel Washington, Pedro Pascal
Produção: Michael A. Pruss, Winston Azzopardi, David Franzoni
Direção de Fotografia: John Mathieson
Música: Harry Gregson-Williams
Classificação: 16 anos
Distribuição: Paramount Pictures










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