Ryan Coogler entrega a maior obra prima do ano em um terror racial que canta, sangra e resiste.
Em mais uma parceria entre Ryan Coogler e Michael B. Jordan, Pecadores conta a história de dois irmãos gêmeos que retornam à cidade natal em busca de recomeçar suas vidas. A trama se passa na década de 1930, no sul dos Estados Unidos, onde a segregação e o preconceito tomavam conta do país. Coogler entrega aqui seu filme mais criativo, reinventando o clássico From Dusk Till Dawn com uma abordagem mais profunda e moderna.
O diretor não tem pressa em nos apresentar a principal ameaça do filme. Após uma gloriosa ambientação de época, em uma introdução que ocupa cerca de 38 dos seus 138 minutos totais, criamos empatia com a dupla de protagonistas antes de sermos presenteados com um banho de sangue tarantinesco e cenas de batalha de tirar o fôlego. É impressionante como tudo aqui funciona: o drama racial, a violência gráfica, os elementos sobrenaturais e os jumpscares. Coogler se aventura em um universo que, muitas vezes, resulta em tropeços mas acerta em cheio em tudo a que se propõe.

Transformar membros da Ku Klux Klan em vampiros não é apenas uma metáfora poderosa: é uma sacada genial. Ao mostrar como a vitalidade das comunidades negras era sugada pelo racismo, o filme evidencia que o preconceito racial é uma ameaça contínua. Ele se alimenta das vidas negras, infiltra-se nas estruturas sociais e se mantém “eterno”, como os monstros que se recusam a morrer. “Pecadores” também aborda a espiritualidade afro-americana e a ancestralidade como fontes de força, conexão e identidade.
Todos os elementos clássicos da literatura gótica estão aqui: alho, estacas de madeira, prata, luz do sol e a famosa necessidade de um convite para entrar em lugares fechados. São essas as armas que os humanos utilizam em sua luta contra o sobrenatural. Coogler se apropria desses símbolos tradicionais para revolucionar o gênero, criando o melhor filme de terror do ano até agora. A trilha sonora, baseada no blues, não está ali apenas para ambientar. Ela é o coração espiritual do filme. É por meio da música que os personagens encontram força, história, resistência e identidade.

“Pecadores” é um filme que olha para o passado com olhos furiosos e, ao mesmo tempo, profundamente poéticos. Ryan entende que o terror mais eficaz é aquele que escancara o que já está entre nós e transforma isso em arte. O mais impactante é que, mesmo com criaturas noturnas e pactos sobrenaturais, o que mais assusta é o que é real: a violência racial, a segregação, a exclusão. Coogler não foge da dureza dessas imagens: o cenário é cercado por olhares de julgamento, banheiros e bebedouros exclusivos para brancos, e até um certo tipo de capuz. Ainda assim, mesmo em meio ao caos, o diretor jamais reduz seus personagens à dor. Neles habitam sentimentos de dignidade, amor e esperança.
Ao intitular o filme Pecadores, Coogler subverte uma lógica histórica: durante séculos, o discurso racista e religioso foi usado para demonizar pessoas negras, associando sua cultura, espiritualidade e modos de vida ao “pecado”. O pai de Sammie, por exemplo, representa essa intolerância vinda da igreja. O título brinca com essa ironia, transformando os verdadeiros pecadores, aqueles que praticam o ódio e a violência, em criaturas sobrenaturais.
Pecadores – Warner Bros. Pictures (2025)
Pecadores é, sem dúvida, o melhor filme do ano até agora. O longa conta com uma direção poderosa e confiante, atuações magistrais (principalmente de Jordan, que brilha em papel duplo), uma trilha sonora extraordinária e uma fotografia digna de Oscar, um lembrete de que o cinema, assim como a música, é eterno.
Crítica por Pedro Gomes.

Pecadores | Sinners
Estados Unidos, 2025, 138 min.
Direção: Ryan Coogler
Roteiro: Ryan Coogler
Elenco: Michael B. Jordan, Hailee Steinfeld, Wunmi Mosaku
Produção: Zinzi Coogler, Sev Ohanian, Ryan Coogler
Direção de Fotografia: Autumn Durald
Música: Ludwig Göransson
Classificação: 16 Anos
Distribuição: Warner Bros. Pictures










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